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Ações de amparo mudam rotina policial

Na semana passada, duas ocorrências distintas e inusitadas chamaram a atenção das corporações. Ambas tiveram início com denúncias anônimas

Alenita Ramirez
03/05/2020 às 12:10.
Atualizado em 29/03/2022 às 13:04

A participação cada vez maior em movimentos de solidariedade e em ações de assistência social tem transformado o cotidiano quase sempre difícil de soldados da Polícia Militar (PM), policiais civis e guardas municipais de Campinas. Às ações de proteção à vida desempenhadas por esses homens e mulheres de farda, juntam-se agora as iniciativas de amparo aos mais necessitados. Na semana passada, duas ocorrências distintas e inusitadas chamaram a atenção das corporações. Ambas tiveram início com denúncias anônimas. Em uma delas, a denúncia foi confirmada, mas o decorrer do atendimento pode ter mudado o destino de um jovem. Já na outra, a denúncia era infundada, porém ajudou uma família que passava dificuldades com a quarentena. No último dia 20, o Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) recebeu uma denúncia de que uma casa no Cidade Singer 2, área de ocupação na região do Campo Belo, servia para armazenar drogas. De posse das informações, uma equipe do Canil do 1° Batalhão de Ações Especiais (Baep) seguiu até o local indicado. Com autorização de um dos moradores, os agentes, com a ajuda do cão farejador, fizeram buscas nas duas casas existentes no terreno, mas em vez de encontrarem entorpecentes, os policiais descobriram uma situação comovente. O homem que permitiu o acesso dos policias ficou desempregado por conta da quarentena. A família, composta pelo casal e três crianças adotadas — de 11, 9 e 6 anos —, passava necessidades. "Deparamos com uma situação precária, que cortou o coração. Já não havia mais nada na casa", disse o sargento Edson Francisco Crispim. "O homem contou a situação da família e nos comoveu. Tínhamos que fazer algo por aquela família", acrescentou. De volta ao batalhão, Crispim se reuniu com o pelotão e contou a história. Comovidos, os policiais decidiram, cada um, doar algo. Uns compraram bolachas, outros leite, outros materiais de limpeza, e assim montaram uma grande cesta. Quase todo o pelotão que estava em serviço contribuiu. A entrega foi feita quatro dias depois. "Foi uma surpresa para nós vermos os policiais chegando aqui com a cesta. Eu havia pedido trabalho, que se algum deles conhecesse alguém que me desse trabalho, já ajudaria para que não pedíssemos aos outros. Eu achava que esses policiais não fossem voltar. Fiquei tão emocionado por ver que existem tantos policiais bons e dispostos a ajudar" , disse o serviços gerais desempregado, Ivaldo Izidoro da Silva, de 47 anos. Silva e a esposa, Gerondina Andreia Domingos da Silva, de 46 anos, são pais biológicos de três rapazes, todos casados. O casal mora nos fundos da casa de um dos filhos. Porém, há quatro anos eles adotaram três sobrinhos pequenos, que estavam prestes a ser entregues à adoção. Para não separar as crianças e nem vê-las longe, Gerondina abriu mão do trabalho e passou a cuidar deles. O casal teve o Bolsa Família suspenso no ano passado — dinheiro que ajudava no orçamento, mantido até então apenas por Ivaldo. Mas como estava em experiência, ele foi demitido da empresa. "Não sei quem fez a denúncia, mas graças a Deus acabou nos ajudando. Eu cheguei a pedir ajuda de alimentos, com vizinhos, pois havia acabado tudo" , contou. Olhar de tristeza Do lado oposto da Rodovia Santos Dumont, na região do Jardim Viracopos, uma outra denúncia, também sobre tráfico de drogas, teve um sentido diferente para guardas municipais que estavam em trabalho na noite do último dia 23. A denúncia dizia que na arquibancada do campo de futebol do Jardim São Cristóvão havia um rapaz, com uma criança de mais ou menos 2 anos, traficando. Uma equipe formada pelo inspetor de Apoio Especial (IAE), Crébio Diniz Almeida, seguiu até o local e confirmou a denúncia. Além do filho, o rapaz de 21 anos, estava com a mulher. "Havia ainda três adolescentes, de uns 14 anos, que fugiram. O rapaz ficou no local e confirmou que traficava. Achamos algumas porções com ele e escondidas no mato. Quando ele percebeu que seria preso, tentou correr, mas o pegamos. A mulher, com a criança no colo, correu e deixamos ela ir, pois ficamos com medo de que ela derrubasse a criança" , contou Crispim. Enquanto os guardas faziam buscas no local, o pai do jovem apareceu para ver o que acontecia. O inspetor explicou e pediu para que ele o acompanhasse até a delegacia, mas o homem se recusou, dizendo que confiava nos guardas. No período em que se aguardava o registro da ocorrência na delegacia, os guardas aconselharam o rapaz, após ouvir sua história. "Como era pouca droga, o delegado optou por liberar o rapaz, para que ele responda em liberdade. Mas a tristeza no olhar dele o comoveu. Quando deixava a delegacia, ele voltou para a equipe e prometeu que nunca mais se envolveria com o tráfico de drogas ou qualquer outra coisa ilícita. Havia sinceridade no olhar dele e torcemos para que realmente cumpra o que disse", disse Diniz. "Sou agente há 22 anos e já participei de muitas histórias com desfechos felizes. Como agente de segurança, nossa função não é só a repressão, mas também a prevenção. E como a prevenção? Orientando. Quando se detém alguém, levamos para a delegacia só quando a situação foge do controle. Fora isso, nossa função é orientar" , emendou. A mãe do rapaz detido disse à reportagem que o jovem tem se mantido em casa e não sai mais à noite. Ela não sabia da promessa do filho feita aos guardas. Moradores de rua recebem marmitex No início de abril, o policial civil Valdeci Lúcio Ribeiro e a esposa, a comerciante Maria de Lurdes dos Santos, decidiram fazer marmitex para doar aos moradores de rua que ficam na região do Terminal Central. O casal preparou um almoço e entregou aos que encontram no local, porém, com a notícia da distribuição, chegaram vários moradores quando as marmitas tinham acabado. Comovidos, Ribeiro e Maria decidiram repetir a ação no domingo seguinte e ampliaram a quantidade. A ação foi feita ao menos cinco vezes e chegou a entregar 45 por dia. O feito começou a ser praticado por outros moradores de Campinas. Hoje, a corrente solidária fez com que os voluntários se revezassem para que não haja sobra. "Eu morei em favela e sei como é a vida das pessoas neste local. Passei fome também. É muito bom ajudar os outros", disse o policial civil.

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