ÁGUA NO FEIJÃO

Bom Prato serve refeições aos domingos e feriados em Campinas

O restaurante popular serve, diariamente, 2,4 mil refeições entre o café da manhã, almoço e jantar

Luis Eduardo de Sousa/ [email protected]
03/05/2023 às 09:02.
Atualizado em 03/05/2023 às 09:02
Fila para o jantar em unidade do Bom Prato na Avenida Dr. Moraes Salles, em Campinas, começa a partir das 16h30 (Kamá Ribeiro)

Fila para o jantar em unidade do Bom Prato na Avenida Dr. Moraes Salles, em Campinas, começa a partir das 16h30 (Kamá Ribeiro)

A unidade do Bom Prato de Campinas ampliou o atendimento ao público que se alimenta no local. Desde o fim de abril, o espaço que serve refeições a baixo custo há 21 anos na Avenida Dr. Moraes Salles, no Centro, passou a servir refeições aos domingos e feriados. A medida foi comemorada pela gestão do Programa na região, ressaltando que "a fome não tem folga". Diariamente são servidas cerca de 2,4 mil refeições divididas entre café da manhã, almoço e jantar, com preços entre R$ 0,50 e R$ 1,00 atendendo pessoas mais vulneráveis. O público varia de idosos que buscam, além do alimento, uma companhia, a pessoas em situação de rua, que se beneficiam do baixo valor para fazer as refeições com maior frequência.

Além da ampliação do atendimento, desde o início da pandemia, em 2020, o espaço passou a servir jantar, completando as três refeições diárias. Para a psicóloga Ana Silvia Rennó, professora da Faculdade São Leopoldo Mandic, a expansão do atendimento é um ganho social e de bem-estar mental para maior parte dos usuários.

Desde o feriado de Tiradentes, no dia 21 de abril, o espaço passou a servir as refeições aos domingos e feriados, antes oferecidas apenas de segunda a sábado. Segundo o gestor do Bom Prato na Região Metropolitana de Campinas (RMC), a mudança é um ganho e "aliviante". "Sempre fomos favoráveis à abertura diária, a fome não tem folga, não dá trégua. Passar a servir o alimento todos os dias é de uma alegria muito grande", conta Reuber Luis Boschini, que dirige também a unidade de Sumaré.

A unidade de Campinas soma 2,4 mil refeições diárias divididas entre 300 no café; 1,8 mil no almoço e 300 no jantar. Além disso, há uma Unidade Móvel do Bom Prato, que está atendendo no Residencial Sirius, no Distrito do Campo Grande. A Unidade Móvel se estabelece em diversas regiões da cidade e permanece por até três meses. Em Sumaré, o Bom Prato fica na Rua José Maria Miranda, no Centro, e junto da unidade da metrópole somam as duas únicas da RMC.

Perfil

O serviço é aberto ao público em geral, mas recebe, majoritariamente, pessoas idosas que vivem sozinhas. De acordo com Reuber, 60% correspondem a esse perfil. "É interessante porque a maioria dos atendidos são de idosos que procuram, além da alimentação, uma companhia. Tanto que, parte deles, ficam um longo período do dia aqui, esperando para fazer outras refeições e conversando, compartilhando casos da vida com os demais. Mesmo os que não moram na região central se beneficiam da gratuidade da passagem, pegam ônibus e se transportam para o Bom Prato" explica.

Cerca de 10% do público são de moradores de rua e os outros 30% se dividem entre comerciantes do Centro e pessoas que estão pela região de passagem.

As filas em frente ao espaço se concentram horas antes do início da distribuição das refeições e chama atenção de quem passa pelas vias adjacentes. O café da manhã é servido as 7h30 e a fila começa se formar por volta das 6h30. Já o almoço começa a ser servido 10h30, com fila a partir das 9h30. Por fim, o jantar registra filas a partir das 15h30 para a refeição que é servida as 17h. Conforme a gestão, nos três horários as refeições acabam em cerca de 30 minutos.

Para a psicóloga Ana Silvia Rennó, a integração promovida pelo Programa é um benefício, além do asseguramento alimentar, para a saúde mental. “A terceira idade (maioria do público) busca essa identidade e o que agrega para eles é a identificação com pessoas da mesma idade, que vão conversar da mesma temática, que vão ter as mesmas questões pessoais e o próprio convívio social. Na prática faz uma prevenção em relação a memória, linguagem e o próprio bem-estar psicológico relacionado a esta troca de conversa”, diz. Neste sentido, Ana vê a ampliação como benéfica também em função das questões emocionais.

Já o sociólogo Vitor Berletta Machado, da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de Campinas analisa que ampliar é importante, mas a alta demanda revela uma situação de vulnerabilidade que é perene. “Existe a questão do atendimento às pessoas em situação de vulnerabilidade que precisam estar alimentadas aos fins de semana e feriado, mas a ampliação mostra primeiro uma realidade de situação que persiste, e segundo que essa situação se ampliou. Você precisar aumentar o número de dias de atendimento é também um reflexo de crise econômica e de achatamento dos salários que o Brasil passou nos últimos anos”, explica. Com menos dinheiro, de acordo com ele, mesmo as pessoas que não estão em situação de vulnerabilidade preferem economizar e buscam o programa para comer com qualidade.

O aposentado Jurandir Silvino, de 77 anos, sai diariamente do Campo Grande e vai de ônibus ao Centro para pegar a refeição. “Isso aqui pra mim é uma grande alegria, é uma família. Eu venho aqui, converso com meus amigos, pego minha comida e agradeço a Deus. Isso aqui é um pedaço da minha vida”.

Quem também sai de outro extremo da cidade todos os dias para comer no bom prato é o aposentado Mariano de Deus, de 69 anos. Ele vive sozinho na região dos DIC’s, e cita como motivação para enfrentar 26 km diários (entre ida e volta) a inviabilidade de cozinhar. “Fazer muita comida pra mim mesmo não vale a pena. O único gás que eu gasto é pra fazer o café de manhã. De resto, pego tudo aqui. Se não existisse o Bom Prato, seria uma infelicidade para todo mundo”, conta. “Espero que um dia tenha uma unidade no Ouro Verde”, conclui.

A ampliação é benquista também pela Secretaria de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos de Campinas. "É muito bem-vinda no combate à insegurança alimentar em nossa cidade. O enfrentamento desse problema é complexo e exige parceria e engajamento entre os entes federativos. Ao expandir sua atuação, o Bom Prato fortalece o compromisso com a promoção da justiça social, o bem-estar e o desenvolvimento humano sustentável para todos os membros da sociedade” declara a titular da pasta Vandecleya Moro.

De acordo com a Secretaria, a metrópole tem cerca de 155 mil pessoas em extrema pobreza (que vivem com até R$ 100 por mês) e cerca de 30 mil em situação de pobreza (que vivem com até R$ 200). Em Sumaré, o atendimento segue de segunda a sábado, servindo apenas café da manhã e almoço. São Paulo tem 100 unidades do Bom Prato, sendo 73 fixas e 27 móveis. Desde que foi fundado, em 2000, o programa já serviu mais 206,5 bilhões de toneladas de alimentos. Conforme o Estado, o volume representa um investimento de mais de R$ 1,1 bilhão.

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