Estatuto da Criança e Adolescente determina período máximo de 3 anos para internação e libertação quando eles completam 21 anos
O Projeto de Emenda Constitucional (PEC) de 1993 que reduz a maioridade penal no Brasil de 18 para 16 anos saiu das gavetas da Câmara dos Deputados em Brasília, ganhou os noticiários e virou alvo de debates acalorados na última semana. A polêmica é antiga, mas ganhou força ao ter a admissibilidade aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, no último dia 31. Acelerar a votação foi uma das promessas do presidente da casa Eduardo Cunha (PMDB), que é a favor do texto.A volta da tramitação da PEC causou um cenário inusitado. É a primeira vez que a opinião de grande parte da população diverge de instituições de diversas naturezas do País. Enquanto pesquisa do Ibope de setembro do ano passado mostra que 83% da população é a favor da imputação de responsabilidade criminal aos 16, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Conferência Nacional dos Bispo do Brasil (CNBB), Rede Evangélica Nacional de Ação Social (Renas), Ministério Público Federal (MPF), Conselho Federal de Psicologia, se posicionaram contra. Hoje, o Estatuto da Criança e do Adolescente determina período máximo de três anos para internação de menores infratores, como libertação imediata quando eles completam 21 anos.Para especialistas em segurança pública a favor da medida, a sensação de impunidade de jovens pode gerar mais violência entre adolescentes. Eles defendem ainda que a Constituição deve se alinhar às leis de países republicanos que foram inspiração para a legislação brasileira, como os Estados Unidos. Juristas contra a PEC alegam que menos de 0,5% de crimes e homicídios são cometidos por menores. Para eles, o governo deveria investir em políticas públicas para proteger os jovens e deixá-los menos vulneráveis ao crime.Em Campinas, a quantidade de jovens apreendidos se manteve praticamente estável nos últimos dois anos. Foram 629 em 2013 e 627 em 2014, segundo dados da Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo. Já nas cidades do Departamento de Polícia Judiciária do Interior 2, os números caíram: foram 1.576 em 2013, contra 1.504 no ano passado. São nos números que o advogado Ariel de Castro Alves, membro do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e fundador da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB, apoia seus argumentos contrários à PEC. Ele considera uma “calamidade” colocar adolescentes no sistema penitenciário comum por causa da diferença das taxas de reincidências. Entre adolescentes que cumprem medida socioeducativa na Fundação Casa, em São Paulo, o índice é de 14%, e de adultos que cumprem pena em prisões no Brasil, de 70%. Alves alega ainda que não há prisões para colocar os adolescentes: são 300 mil presos para 100 mil vagas oficiais no País. “Não faz sentido tirar os adolescentes infratores de um lugar onde eles têm escola, acompanhamento psicopedagógico e cursos profissionalizantes para colocá-los em masmorras medievais. Hoje a prisão é somente um depósito de pessoas”, explicou.O advogado criminalista acredita que o que inibe o crime não é o tamanho da pena, mas sim a certeza de punição, e lembra que hoje apenas 3% dos boletins de ocorrência no Brasil são julgados. Mas no caso da delinquência juvenil, é diferente, segundo ele. Ele afirmou que as causas estão na falta de políticas públicas voltada ao bem-estar de crianças e adolescentes e na sociedade de consumo. “Hoje não existem políticas afirmativas para o jovem estudar com qualidade, se profissionalizar e nem lazer. Além disso, os meios de comunicação propagam o consumismo exacerbado que o jovem pobre não tem acesso. E onde o Estado exclui, o crime inclui”, falou.RigorO professor da Universidade Cândido Mendes, mestre em antropologia, ex-secretário de Segurança de São Gonçalo (RJ) e ex-capitão do Batalhão de Operação Especiais do Rio de Janeiro, Paulo Roberto Storani, acredita que a PEC será aprovada por clamor popular, mas não é a favor de todos os seus pontos. Storani defende, no entanto, uma pena maior a adolescentes reincidentes e que cometem crimes contra a vida, como homicídios e latrocínios. “As varas da infância têm uma tendência de querer deixar o menor em medida socioeducativa o menor tempo possível. Mas a população está estarrecida pelos crimes violentos cometidos por esses jovens.”Storani defende que a responsabilidade de delitos como homicídio e latrocínio cometidos por jovens com 16 anos ou mais deixe de ser penal e passe a ser criminal. O regime de prisão, no entanto deve ser diferenciado, segundo ele. “A pena deve ser proporcional ao crime cometido. Mas tem que ser discutido onde esse menor irá ficar. Ele não pode ser encarcerado com outros presos. Nesse ponto, a lei que circula no Congresso é falha”, disse. O antropólogo afirma que, culturalmente, um jovem de 16 anos já tem noção do que é certo e errado e pode ser cobrado de atos com reflexos na vida de outras pessoas.