EXPOSIÇÃO

Gênesis: registros de um mundo ainda virgem

Sebastião Salgado viajou durante oito anos por regiões remotas do planeta e clicou maravilhas

Fábio Trindade
06/09/2013 às 08:06.
Atualizado em 25/04/2022 às 03:13
Sebastião Salgado ( Dominique Torquato/AAN)

Sebastião Salgado ( Dominique Torquato/AAN)

Sebastião Salgado é único em sua arte. Ele se tornou um fotógrafo conhecido em todo o mundo por escancarar os transtornos da humanidade. Mostrou os pobres da América Latina no livro Outras Américas, em 1986; cobriu durante um ano a seca no Norte da África e publicou o que viu em Homem em Pânico, também em 1986; por aqui, acompanhou a migração de milhares de trabalhadores em busca de melhores condições de vida em cidades grandes na série Trabalhadores, em 1996, se consagrando como um dos fotógrafos mais prestigiados da Terra; e foi aclamado internacionalmente com Êxodos, projeto realizado ao longo de seis anos, em viagens por 40 países, para contar a história da humanidade em trânsito.Mas, com o prestígio, vieram os efeitos colaterais. “Em Êxodos, que foi apresentado no ano 2000, eu passei por momentos muito difíceis. Vi situações realmente terríveis da nossa espécie. Eu cheguei a presenciar 15, 20 mil mortos em um único dia. Era algo que não se dava para imaginar. Pilhas de mortos, com seis metros de altura por 100 metros de comprimento. E, presenciando todos esses acontecimentos, meu corpo começou a sofrer. Na realidade, eu comecei a morrer”, conta o fotógrafo. Foto: Dominique Torquato/AAN Tartaruga gigante que posou para o fotógrafo no arquipélago de Galápos Foto: Dominique Torquato/AAN Imagens de grupos humanos registrados por Salgado Exatamente por isso, havia chegado a hora de mudar. Portanto, esqueça tudo o que já viu de Sebastião Salgado. “Deus disse: ‘Faça-se a luz’. E a luz se fez. Deus viu que a luz era boa. Deus separou a luz das trevas.” O primeiro livro da Bíblia, Gênesis, traz essas palavras. E, inspirado nisso, separando a luz das trevas nos lugares mais longínquos do planeta, tendo como resultado sua tradicional fotografia em preto e branco, Sebastião Salgado fez o projeto Gênesis, algo diferente de tudo que já publicou e, ao mesmo tempo, com a mesma preciosidade. O resultado pode ser visto pelo público no Sesc Belenzinho, em São Paulo, até 1 de dezembro.Ao invés de observar homens e suas lutas em um mundo globalizado, o fotógrafo mineiro fez mais de 30 viagens diferentes a regiões remotas do globo — a maioria delas inóspita e de dificílimo acesso — para revelar maravilhas que permanecem imunes à aceleração da vida moderna. “Pela primeira vez, fui fotografar os outros animais”, completa. Montanhas, desertos, florestas, tribos, aldeias e animais caíram nas lentes do gênio. “Eu quero mostrar para as pessoas o planeta. Bom, na verdade, é quase como uma nova apresentação do planeta, uma oportunidade de as pessoas compreenderem que nós também somos natureza, que nós temos uma necessidade imensa de preservar tudo isso e, principalmente, que temos a obrigação de reconstruir o que destruímos”, exalta.Para isso, Salgado precisou de oito anos na estrada, e mais dois para uma minuciosa preparação, para enfrentar lugares tão diversos como Sibéria, Nova Guiné, Galápagos, República do Congo, Ilhas Malvinas e Alasca. “Foram 32 reportagens, o que me deu uma média de dois meses em cada local que eu visitei, tanto comunidades, quanto paisagens. Eu passei em média oito meses por ano viajando. Passava dois meses em cada lugar, voltava para Paris para editar, ficava um mês me preparando para a próxima e partia. Mas posso dizer que foram os anos mais ricos da minha vida”, acrescenta, confessando que chegou a ter dúvidas se conseguiria fazer o projeto.“Eu sou um privilegiado. Eu jamais achei que seria capaz de fazer algo dessa magnitude de novo, por isso digo que Gênesis fecha um ciclo de histórias, de todas que eu tive com os outros projetos que fiz. Todas as guerras na África, os refugiados, Êxodos, tudo. Gênesis completa esse ciclo. Eu aprendi tudo o que eu aprendi e só assim eu fui capaz de fazer esse projeto. ”São 245 fotografias, divididas em cinco seções geográficas, organizadas por ecossistemas, pois foi essa a melhor maneira, garante a curadora Lélia Wanick Salgado, mulher do fotógrafo, de vislumbrar o funcionamento da natureza. Planeta Sul, Santuários, África, Terras do Norte e Amazônia e Pantanal, mais do que fotos, prometem colocar o espectador em comunhão com a natureza. “Quando você chega a determinados lugares, vê coisas inimagináveis, você passa a fazer parte daquilo, passa a compreender o vento, as montanhas. Você se compreende como natureza. E isso é algo que todos deveríamos entender, para a gente viver de uma maneira muito mais intensa e prazerosa. O fato de a gente ter abandonado o planeta e ido em direção às cidades, nos fez esquecer o que há por aí. A gente merece ter a oportunidade de conhecer realmente o planeta, ou conhecê-lo melhor, de saber o que realmente importa”, diz Salgado.É preciso ter tempo para para apreciar e compreender Gênesis. Afinal, Sebastião Salgado mostra tudo o que não encontramos nas esquinas. Mostra boa parte dos 46% do planeta que está intocado. E cada clique tem uma emocionante história por trás. AGENDE-SEO quê: Gênesis, de Sebastião Salgado (Curadoria: Lélia Wanick Salgado)Quando: Até 1 de dezembro, terça a sábado, das 10h às 21h; domingos e feriados, das 10h às 19:30hOnde: Sesc Belenzinho (Rua Padre Adelino, 1.000, Belenzinho, São Paulo, fone: (11) 2076-9700Auanto: Entrada franca

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