Ministério Público Federal acusa ex-governador e atual senador José Serra de lavagem de dinheiro no Exterior (Beto Barata/Agência Senado)
O Ministério Público Federal mira suposta compra e venda de quatro obras de Cândido Portinari pela offshore Dortmund, gerida por Verônica Serra, filha do ex-ministro José Serra (PSDB) e alvo de investigações da Lava Jato sobre lavagem de propina. A transferência teria sido feita pela Hexagon, offshore controlada pelo empresário José Amaro Ramos, acusado de usar contas no exterior para fazer repasses ao tucano. A informação consta em pedido de reconsideração apresentado pela Procuradoria contra decisão do juiz Diego Paes Moreira, 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, que autorizou as diligências. De acordo com o MPF, as buscas na casa de Serra poderiam 'elucidar' uma transação de 326 mil euros da Hexagon, de José Amaro Ramos, para a Dortmund, de Verônica Serra, para a compra e venda de 'quatro Portinaris'. "Assim, é possível esclarecer na busca se há a existência de lavagem de dinheiro em favor de José Serra por meio de obras de arte, com o respectivo pagamento no exterior, ou se trata-se apenas de uma justificativa formal para a transferência", afirmou a Lava Jato. "A presença de obras de arte na residência de José Serra que possam ter sido utilizadas para a lavagem de ativos de origem ilícita não é, portanto, mera suposição, mas sim algo de alta probabilidade e que justifica a medida visada". O juiz Diego Paes Moreira aceitou os argumentos do Ministério Público Federal e autorizou as buscas contra Serra, destacando que 'em algumas oportunidades as operações financeiras suspeitas apresentam como justificativa a suposta negociação de obras de arte'. O magistrado, porém, autorizou somente a busca por registros das transações, negando apreensão de peças artísticas. Aplicação na bolsa Ao autorizar as buscas, o juiz também destacou movimentações de contas da Dortmund, gerida por Verônica Serra, a partir do pagamento milionário pelos 'quatro Portinaris', e apontou 'indícios' sobre uso do dinheiro na compra de ações na bolsa. A transação pelos 'quatro Portinaris' foi efetuada no dia 31 de março de 2006 - data em que a conta Firenze, da Dortmund, registrou a entrada de 326 mil euros. O valor teria sido dividido no dia 25 de abril: 120 mil euros foram convertidos em 150 mil dólares, aplicados em parte na compra de ações da Heinz e da Leucadia National, conforme extratos bancários apresentados pela Procuradoria. Os 200 mil euros restantes teriam sido depositados em uma segunda conta da Dortmund, mas retornaram para a conta 'Firenze' em 9 de maio de 2006. Desse montante, cerca de 152 mil euros foram usados para quitar o pagamento de 3.760 ações da Inbev SA uma semana antes. "Há indícios de que parte do dinheiro sob investigação supostamente foi aplicado em ações no período de 2006 a 2014, gerando dividendos", apontou o juiz Paes Moreira. No mesmo dia que a PF conduzia a diligência, Serra foi denunciado por lavagem de dinheiro no caso de propinas da Odebrecht pagas no exterior em troca de benefícios na obra do Rodoanel Sul. Segundo a Procuradoria, o tucano usou 'sofisticada rede de offshores' para dissimular o pagamento indevido da empreiteira. Os valores atualizados das propinas são estimados em mais de R$ 191,5 milhões. Em nota, a defesa de Serra manifestou 'profundo repúdio à busca e apreensão' realizada na casa do tucano. "Se o Ministério Público entendeu, ainda que de forma equivocada, que havia razões para iniciar um processo, o que justifica, além da intenção de constranger, uma medida invasiva como essa?", afirmaram os advogados Flávia Rahal e Sepúlveda Pertence, que defendem o ex-ministro. A defesa do empresário José Amaro Ramos também nega as acusações e afirma que os pagamentos feitos no exterior decorreram de contratos existentes entre a sua empresa e a Odebrecht sediada em Portugal, 'sem nenhuma ligação com o senador José Serra'. Defesa chama operação de 'devassa' A defesa do empresário José Amaro Ramos, acusado de operar esquema de lavagem de propina da Odebrecht em favor do ex-ministro José Serra (PSDB), acusou o Ministério Público Federal de cometer ‘indevida e constrangedora devassa’ durante a Operação Revoada, deflagrada na última sexta-feira. Ramos é investigado por gerir uma offshore que supostamente recebeu e repassou propinas da empreiteira para a Dortmund, offshore gerida por Verônica Serra, filha do tucano, que seria o real beneficiário do esquema. Amaro não foi denunciado pela Procuradoria na última sexta, mas foi alvo de buscas na Operação Revoada. Segundo a defesa, liderada pelos advogados Eduardo Pizarro Carnelós, Roberto Soares Garcia e Flávia Duarte, o delegado responsável pela diligência não teria dado acesso à íntegra da decisão do juiz Diego Moreira, 6ª Vara Criminal Federal. Apesar da ausência do documento, a Procuradoria manteve a diligência. Foram apreendidos na casa do empresário HDs externos, pen-drives, obras de artes e documentos datados de 2002 a 2020. A defesa alega que teriam sido coletados documentos que seriam protegidos pelo sigilo da comunicação entre cliente e advogado. “Foi assim que terminou a diligência escorchante: tudo muito característico de indevida e constrangedora devassa, ato próprio de Estados autoritários, inadmissível nos dias de hoje no Brasil”, afirmaram os advogados de José Amaro Ramos.