MOACYR CASTRO

Você já morreu?

04/08/2013 às 05:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 06:41

Tripulantes de um voo Natal – Lisboa juram que já. Testemunhas que não viram nem sentiram garantem que partiram para a capital lisboeta, foram parar no outro lado do mistério e acordaram mortos. Juntos, seguiram para os jardins da Torre de Belém. Depois, só restam dúvidas. Quem conta é a campineira Paula de Paula, uma das comissárias daquela aventura. Ela acaba de lançar outro livro de peripécias a bordo, agora em edição virtual, pela Saraiva. Este é só um trecho de 'Idas e Vindas' que, dependendo do sabor, pode terminar domingo que em. Não entre em pânico (ainda, como diz a autora):“O avião apresentava probleminhas há um tempo, mas a gente se acostuma. Ao meu lado, um amigo, atrás de mim o mecânico Ronaldão, ao lado dele, Max, e atrás deles, Queilinha. Acordei com meus pés a tremer e ouvi barulhos de estouro, como dos carros antigos pipocando o escapamento. Os barulhos aumentaram; meu colega estava apavorado. Calma, fui até a cozinha. Os meninos falavam sem parar: ‘Está saindo fogo do motor!’. Voltei, olhei pela janela: a cada estouro, saía uma chama. Senti a mão de Max no meu ombro:- Irmã, não é desse lado; o fogo é do outro.- Max, é desse lado sim, olhe lá.- Irmã, venha comigo.O motor também estourava. Estávamos com os dois motores em pane. Os passageiros dormiam, mas uma moça acordou e ainda meio sonolenta falou:- Aquilo é fogo?Pedi aos meus colegas que fossem fechando as persianas nos dois lados. Fui até aquela moça calmamente, fechei a persiana e disse:- Não é fogo. Estamos no meio de uma nuvem; são raios, volte a dormir.O comandante era um dos mais temidos da empresa e detestava ser contestado. Alguns colegas choravam; outros, imóveis; a Queilinha continuava dormindo tranquilamente.Conversei com o mecânico:- O que fazemos?- Se a coisa estivesse bem séria, os pilotos já teriam nos chamado.- Temos 10 minutos até a Ilha do Sal; se fosse o caso, já estaríamos descendo.- É nossa única opção; esse avião não chega a Lisboa e esse modelo não plana, vamos afundar direto de nariz.Os estouros continuavam; liguei para a cabine. O copiloto atende:- Estamos cientes.- Cientes que são os dois motores?- Como assim, os dois?- Checamos visualmente, são os dois!Silêncio... Desligaram o interfone.Já tínhamos passado a Ilha do Sal. O avião não mudara a altitude nem começara a descer. Era certo que não chegaria a Lisboa. Naquela altitude e velocidade, se entrasse em mergulho, a resistência da água o faria explodir. Sabíamos disso. Nós nos olhamos; demos as mãos; oramos com os olhos cheios de água; fizemos uma reunião para planejar um pouso na água, cada um voltou ao seu lugar, colocamos os cintos e aguardamos o momento final...Tchan... Tchan... Tchan... Tchan...Não percam o próximo e emocionante capítulo, domingo. Pregado no poste: “Alguém é ateu num avião em chamas?”

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